3 de março de 2018

O que torna um humano diferente do outro? A cor? A classe social? O pedaço de terra em que nasceu?


Por Gustavo Guimarães Gonçalves


“NOMES PARA FURACÕES” é uma peça com quatro atores que representa a brutalidade humana contra imigrantes. A arbitrariedade associada a poderes e vontades. um delírio sobre a crise humanitária de nosso tempo, tendo dois imigrantes (pai e filha) e dois soldados como protagonistas.

Alice, assim como na história clássica e como toda criança envolvida em uma guerra é mais uma que cai em um buraco sem saber o motivo. São Alices de tempos absurdos, de histórias absurdas em um lugar em que reis e rainhas dançam e comem só pensando em mais anéis em suas mãos.

Foto: Ale Cruz

Dando suporte para tudo isso: soldados. Seres que se escondem atrás de armas e estão a serviço de algo. Poderes e vontades. Na peça, duas cômicas figuras que até mesmo sem poder pegar em armas, precisam de outras mãos para matar e terem a sensação de poder. E novamente a ficção retrata a dura realidade, o abuso dos “Bravos soldados” (repare bem nas aspas) que se escondem atrás de armas, é o abuso de muitos que gastam a vida destruindo a humanidade. 

Outras vidas que não querem guerra, nem poder, apenas a paz e o luxo de viver; Como o pai de Alice que tem forças para chegar ao dia seguinte por ser guiado pelo amor e a vontade de ver a filha feliz, vivendo o que ainda não viveu. Podendo amar. Podendo sentir. Podendo ir até outros horizontes.

Foto: Ale Cruz


No cenário da peça: Relógio, xícara, livro, abajur, sino, tudo pendurado, fazendo o tempo e o espaço se multiplicarem com loopings temporais de vidas sem esperança, separadas por exclusões. Porém, os atores brincam com as luzes, como a luz utópica que vimos no fim desse túnel contemporâneo, cheio de soldados se auto mutilando. Infelizmente não tem lugar no mundo sem soldados. Armados, privilegiados ou alienados.

Assisti à peça em fevereiro de 2018, tempos de bombardeios na síria, os jornais dizem 250 mortos, porém, impossível conta-los, não tem trégua. O soldado? A vítima? Da tranquilidade de apertar um botão, para o desespero e o último suspiro de uma explosão. Importante ressaltar que assisti à peça em tempos de intervenção militar no Rio de Janeiro, tempos em que a palavra “violência” é sinônimo de segurança pública e salta da boca de políticos extremistas. Brasil que o crucifixo que representa fé faz uma junção com a arma, que representa extermínio e ódio. Estamos bem próximos dos imigrantes.

Também estamos bem próximos dos soldados de guerra: temos a vontade de ser bélicos o tempo todo. Cada um tem um homem bomba dentro de si, capaz de despertar nosso instinto animalesco a qualquer momento, porém, podemos pensar e nos diferenciarmos de bichos que não se colocam no lugar do outro. Temos o poder, assim como no teatro, de lembrarmos que o próximo é gente como a gente.   

Essa peça me apresenta provas: de que o teatro é vivo.

Gustavo Guimarães Gonçalves, é diretor, ator e dramaturgo. 

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