21 de outubro de 2011

Anotações sobre um ensaio

(Grupo Pandora 8 de Outubro de 2011)

Os canibais começam a devorar a planta, que dizem ser carnívora, mas talvez seja apenas antropofágica, e nos sabemos que nem todos os Homens tem a carne bem passada.

As primeiras cenas que assisti do processo de montagem do Grupo Pandora foram desafiadoras, apesar de conhecer muito bem esta caixa, o que dela saiu em nada me lembrou velhas reminiscências pandorescas. Em cena, 4 atores dominando a arena selvagem & quente para apenas 3 espectadores, incluindo este narrador, exteriorizavam o processo de pesquisa, que se não me engano começara apenas algumas semanas atrás.
No início da apresentação, a primeira imagem foi a de um macaco-humano (ou vice-versa) que peleava com um globo terrestre do tamanho de um globo futebolístico. Demonstrava sua indignação contra a humanidade, ou contra nós, tênues espectadores (éramos três, lembra?), pulando e gritando com a sutileza de um gorila assustado.

Logo em seguida, éramos apresentados a uma bailarina latino-americana que respondia em castelhano às perguntas de uma jovem que apenas interrogava e ria, sem entender nunca qual era o nome daquela personagem. Ah, tinha me esquecido que antes, ou depois, uma poesia de Camões havia sido recitado sob o bumbo tocado por um dos atores, Camões é sempre bem vindo. A última parte da tríade cênica foi costurada num oceano de amarelo e branco-sujo (branco-sujo é a cor natural da doença) num alusão premonitória aos incidentes envolvendo lixo hospitalar e uma confecção nordestina (vide notícias desta semana, estamos em 18 de Outubro de 2011) por onde, como que se Moisés houvesse aberto uma passarela de madeira, passavam os clichês brasileiros personificados pelos atores, que por sua vez lhe concediam toques antagônicos para amenizar, ou questionar se esses clichês citados teriam vida longa. E tudo com a trilha-sonora de uma solitária guitarra que gritava independência-ou-morte às avessas, entoando anti-hinos brasileiros conhecidos como Rock americano. No fim, se é que era o fim, afogava-se o macaco, ou os clichês, ou o ator, naquele mar amarelo de tecido (ou de doença) e as cenas, enfim, tornavam-se um espetáculo presenciado por uma multidão de três pessoas.

Os canibais já começaram a devorar a planta, disso fui testemunha e, como simpatizante das artes divinatórias dos ciganos fumantes, atesto que o futuro desta caixa pandoresca, está traçado e é instigante. O processo pelo qual, escolheram perpetuar a dúvida, deve expandir ainda mais a qualidade e maturidade deste breve relato-documental, e absolutamente vai resultar em algo que vai valer a pena, além do ingresso. De certo, haverá mais que apenas três solitários para documentar esta refeição surrealista (ou seria antropofágica-integralista?).

Os canibais já começaram a devorar a planta, e a planta é carnívora.

São Paulo, 18 de outubro de 2011.

Vince Vinnus

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